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Fiquei sentado na beira da praia olhando o mar durante longo tempo. Alguns pensamentos passam pela cabeça, mas se dissolvem. Não consigo apreender nada.

Desde pequeno a vida decidiu que eu seria inteligente, com muitas aspas. As pessoas acreditam que a inteligência está relacionada a neurônios, QIs e testes de fazer xis. Ou ainda que uma pessoa pode ficar mais inteligente ou até mais burra. Eu acredito no determinismo e como nasci magrelo e sem muitos atributos físicos, logo percebi que deveria me destacar pela inteligência com aspas. Por azar, ou não, também fui agraciado com a deficiência visual e consequente necessidade de óculos, fato que curiosamente costuma dar ar de sapiência.

No princípio eu me esforçava na escola (bem no princípio) sendo um pequeno bom aluno. Com o tempo fui achando a escola meio entendiante e comecei a ler bastante livros de literatura, filosofia, história, conhecendo um pouco de Sócrates, Marx ou Freud por conta própria. Apaixonei-me pela leitura e fiquei aficcionado pela ideia de ser o cara mais inteligente do mundo. Mas sempre fui um pouco preguiçoso, nunca me tornando assim um super nerd. Podemos dizer que eu sou um cara curioso.

Entrei numa universidade federal, mas foi meio de para-quedas. Pra ser inteligente diziam que era importante fazer faculdade. Fiz mestrado, estudei algumas coisas bem complexas mas extremamente específicas.

Quanto mais eu lia, assistia documentários e aprendia um pouco mais sobre a história da música, da cerveja ou das revoluções burguesas, mais reafirmava aquele clichê socrático do “tudo que sei é que nada sei”.

Mas além disso percebi também, pela observação meticulosa e contínua (ou seria apenas fruto da velhice ou de um Alzheimer precoce?) de que o cérebro tem uma limitação para reter informações, como um HD de computador cheio ou aquele quartinho de bagunças, onde só entra mais alguma coisa se sair outra. Aliás, acredito que com o avanço da velhice terei que jogar duas ou três informações fora para guardar uma informação nova.

Percebi também que eu poderia aprender coisas complexas, dominar completamente alguns assuntos e continuar ignorante quanto a inúmeros outros assuntos. A inteligência é uma Wikipedia, você nunca vai ler todos os links.

Fico olhando o mar mas não consigo entendê-lo. Penso em Odisseu, nas marés, mas o marulho não me deixa pensar em nada.

Penso em todas as verdades vomitadas por aí, nas redes sociais , nas entrevistas, nos livros, inclusive as minhas. Penso e não consigo chegar a conclusão nenhuma.

Diante do mar sinto-me ignorante e esse sentimento é deliciosamente tranquilizador.

Apesar de todas as maravilhas da vida, penso que o grande prazer só será encontrado na morte. Quando tudo deixar de existir, para todo o sempre, e a paz, na eterna ignorância, será inevitável.

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